sexta-feira, 15 de dezembro de 2006

O QUE QUER UMA MULHER?
Martha Medeiros
Um bebê nasce. O médico anuncia: é uma menina! A mãe da criança, então, se põe a sonhar com o dia em que a sua princesinha terá um namorado de olhos verdes e casarácom ele, vivendo feliz para sempre.A garotinha ainda nem mamou e já está condenada a dilacerar corações.Laçarotes, babados, contos de fadas: toda mulher carrega a síndrome de Walt Disney.Até as mais modernas e cosmopolitas têm o sonho secreto de encontrar um príncipe encantado. Como não existe um Antonio Banderas para todas,nos conformamos com analistas de sistemas, gerentes de marketing,engenheiros mecânicos. Ou mecânicos de oficina mesmo, asituação não anda fácil. Serão eles desprezíveis? Que nada. São gentis, nos ajudam com as crianças, dão um duro danado no trabalho e têm o maior prazer em nos levar para jantar. São príncipes à sua maneira, enós, cinderelas improvisadas, dizemos sim! sim! sim! diante do altar; mas,lá no fundo, a carência existencial herdada no berço jamais será preenchida.Queremos ser resgatadas da torre do castelo. Queremos que o nosso pretendente enfrente dragões, bruxas, lobos selvagens.Queremos que ele sofra, que vare a noite atrás de nós, que faça tudo o que o JoséMayer, o Marcelo Novaes e o Rodrigo Santoro fazem nas novelas.Queremos ouvir "eu te amo" só no último capítulo, de preferência num saguão de aeroporto, quando ele chegaráa tempo de nos impedir de embarcar.O amor na vida real, no entanto, é bem menos arrebatador. "Eu te amo" virou uma frase tão romântica quanto "me passa oaçúcar". Entre casais, é mais fácil ouvir eu "te amo" ao encerrar umaligação telefônica do que ao vivo e à cores. E fazem isso depois de terem sexingado por meia-hora. "Você vai chegar tarde de novo? Tenha asanta paciência, o que é que você tanto faz nesse escritório? Ontem foi amesma coisa, que inferno! Eu é que não vou preparar o jantar para você às dez da noite, te vira. Tchau, tambémte amo." E batem o telefone possessos.Sim, sabemos que a vida real não combina com cenas hollywoodianas.Sabemos que há apenas meia dúzia de castelos no mundo,quase todos abertos à visitação de turistas. Sabemos que os príncipes, hoje, andammeio carecas, usam óculos e cultivam uma barriguinha de chope.Não são heróicos nem usam capa e espada, mas ao menos são de carnee osso, e a maioria tentaria nos resgatar de um prédio em chamas, caso a escadamagirus alcançasse o nosso andar. Não é nada, não é nada, mas já é alguma coisa.Dificilmente um homem consegue corresponder à expectativa deuma mulher, mas vê-los tentar é comovente. Alguns mandam flores, reservamquarto em hotéizinhos secretos, surpreendem com presentes,passagens aéreas, convites inusitados. São inteligentes, charmosos, ousados, corajosos, batalhadores.Disputam nosso amor como se estivessem numa guerra, e pra quê?Tudo o que recebem em troca é uma mulher que não pára de olhar pela janela,suspirando por algo que nem ela sabe direito o que é.Perdoem esse nosso desvio cultural, rapazes. Nenhuma mulher se sente amada o suficiente.


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